sexta-feira, 25 de outubro de 2024

Resident Evil 1 (PS1)


Eu me lembro bem das noites em que eu, ainda criança, espiava meu irmão mais velho jogar Resident Evil 1 no PlayStation. Nunca cheguei a segurar o controle na época, mas assistir da segurança de um canto da sala já era o suficiente para sentir um frio na espinha. Aquele universo sombrio e meticulosamente construído me cativava: as criaturas perturbadoras, as estátuas imponentes, a ameaça da planta carnívora e o enigma das joias do olho do tigre. Era fascinante. De certa forma, parecia que eu também estava lá, explorando cada corredor escuro e misterioso, mesmo que de longe. Revisitar esse clássico hoje em dia é como abrir um álbum de memórias macabras, voltando ao mesmo tempo para uma época de pura curiosidade e medo genuíno.

Lançado em 1996 pela Capcom, Resident Evil 1 marcou o nascimento de um gênero que viria a definir a essência do horror nos videogames: o survival horror. A trama começa com a equipe Bravo da S.T.A.R.S. desaparecendo misteriosamente nas Montanhas Arklay. Em resposta, a equipe Alpha é enviada para investigar, composta por personagens icônicos como Chris Redfield e Jill Valentine. Em uma série de reviravoltas, eles se veem presos em uma mansão sinistra e repleta de segredos. A escolha de um cenário como a mansão Spencer não foi por acaso; sua arquitetura labiríntica e enigmas intrincados contribuíam para a sensação de estar em um lugar genuinamente real, mas ao mesmo tempo absurdamente perigoso. Essa escolha de design reflete a intenção do jogo de tornar cada elemento o mais imersivo possível, um aspecto que ficou marcante e até peculiar na série, como o uso de ervas medicinais e máquinas de escrever para salvar o progresso, criando um senso quase paradoxal de realismo fantástico ou de fantasia realista.

O jogo te dá a opção de escolher entre Chris ou Jill, e cada um oferece desafios únicos. Enquanto Chris é mais resistente, ele possui um inventário menor e precisa de mais chaves; já Jill tem mais espaço para itens e conta com habilidades de desbloqueio. Ah, e claro, ela ainda tem a ajuda de Barry Burton em momentos cruciais. A visão de câmeras fixas e os cenários pré-renderizados contribuem para um clima claustrofóbico que é a cara do jogo — nunca sabemos o que está à espreita logo fora do campo de visão. Essa incerteza é intensificada pelo sistema de inventário limitado, onde cada escolha de item pode ser crucial para a sobrevivência. Embora esse gerenciamento rígido de recursos possa parecer um tanto arcaico para alguns jogadores modernos, ele é parte fundamental do DNA de Resident Evil, evocando um senso de urgência e tensão que poucos jogos conseguem replicar.

Resident Evil 1 não é apenas sobre monstros e tiros; é também sobre enigmas desafiadores e engenhosos. Quem não se lembra do enigma do relógio na sala de jantar, onde os ponteiros precisam ser alinhados para revelar um compartimento secreto? Ou da sala dos emblemas, em que partituras musicais e trocas estratégicas entre itens revelam novas passagens? E claro, a Planta 42, um monstro vegetal mutante que cresceu descontroladamente após o vazamento do T-Virus. Trata-se de um inimigo formidável que exige mais do que força bruta para ser derrotado. Seu enigma complexo de substâncias químicas precisa ser resolvido com precisão, criando uma mistura específica que enfraquece suas raízes. Um erro na ordem de criação pode resultar em um composto tóxico, colocando o jogador em risco, o que torna essa batalha ainda mais tensa e desafiadora. Esses enigmas minuciosos, juntamente com a sensação de terror psicológico, são o que tornam o jogo uma experiência verdadeiramente única, com um toque de excentricidade que mais tarde se tornaria um marco da franquia.

A atmosfera de Resident Evil 1 é uma aula de construção de tensão. Com cenários pré-renderizados, ângulos fixos de câmera e uma trilha sonora que arrepia, o jogo te envolve por completo. Cada som, desde os passos ecoando nos corredores até as portas rangendo, contribui para o terror. E os corredores escuros e estreitos? Esses, sem dúvida, são um dos elementos mais marcantes, transformando a mansão Spencer em um personagem à parte. É impossível esquecer o impacto cultural desse jogo, que não só estabeleceu novos padrões para o gênero, mas também lançou uma franquia que atravessou gerações. No Brasil, o jogo foi um fenômeno, e muitos jogadores — eu incluída — ainda têm memórias vívidas da adrenalina e do medo que ele proporcionava. Mesmo os elementos mais "bizarros", como a inclusão de máquinas de escrever para salvar o jogo, se tornaram símbolos nostálgicos, refletindo a abordagem quase 'esquemática' do design do jogo, que misturava o real com o surreal de maneira icônica.

Foram feitas duas remasterizações do jogo que redefiniram a experiência de Resident Evil para diferentes gerações. O Resident Evil Remake, lançado em 2002 para o Nintendo GameCube, reinventou o clássico de 1996 ao elevar sua atmosfera e mecânicas a um novo nível, trazendo gráficos detalhados, ambientes expandidos e novos desafios. Essa versão manteve a essência do original, mas adicionou camadas de tensão e complexidade, com controles mais fluidos e um design de cenários ainda mais imersivo, além de enigmas aprimorados para desafiar tanto veteranos quanto novos jogadores. Já em 2015, o Resident Evil HD Remaster modernizou ainda mais essa reimaginação, adaptando-a para plataformas contemporâneas com gráficos em alta definição, iluminação refinada e suporte a controles analógicos. As melhorias técnicas, como texturas em 1080p e áudio remasterizado, trouxeram uma sensação renovada de claustrofobia e horror, garantindo que a obra permanecesse tão intensa e envolvente quanto no lançamento original.

Há algumas diferenças entre as versões. Por exemplo, no memorável enigma da estátua do tigre. No Resident Evil original de 1996, a inscrição "Alguns tigres possuem um olho vermelho e um olho azul" dá a pista para os jogadores inserirem as gemas azul e vermelha nas órbitas oculares da estátua. Colocar a gema azul revela o Wind Crest, um emblema que o jogador precisa coletar para avançar em áreas específicas do jogo, enquanto a gema vermelha, que é opcional, libera a Colt Python — uma das armas mais poderosas, perfeita para lidar com os inimigos mais desafiadores. Já no Resident Evil Remake de 2002, a dinâmica muda: a gema azul continua obrigatória, mas a vermelha é substituída pela amarela, que libera um Disquete MO, usado para destravar portas de segurança e salvar Jill, garantindo o melhor final do jogo.

Por outro lado, Resident Evil 4, lançado em 2005, representou – para mim e para os fãs mais nostálgicos – uma ruptura tão grande na série que quase poderia ser um jogo completamente diferente, talvez até com outro nome. Enquanto os três primeiros títulos abraçavam o horror psicológico, com suas câmeras fixas, recursos escassos e ambientes opressivos, o quarto jogo adotou uma abordagem mais voltada para a ação, ao substituir o terror mais lento e psicológico por uma ação intensa e uma câmera sobre o ombro, algo inédito na franquia até então. Também houve a implementação de cenários mais abertos e uma iluminação mais clara, diminuindo a sensação de suspense. Apesar de entender o apelo desse novo formato, sinto que o ritmo mais frenético acabou diluindo a essência do terror original que tanto definia a série. Reconheço que Resident Evil 4 é tecnicamente excelente, mas essa transição comprometeu a continuidade estética e narrativa da franquia. Curiosamente, muitos o consideram um dos melhores jogos dentre todos, como argumentado pelo canal JJ, em um vídeo intitulado "Resident 4 é uma obra de arte". Nele, o youtuber enfatiza como o jogo trouxe gráficos impressionantes e uma cinematografia marcante. Ele também ressalta os inimigos mais agressivos, a atmosfera envolvente e uma jogabilidade mais fluida e dinâmica, características que não apenas redefiniram Resident Evil, mas também influenciaram profundamente os jogos de ação e terror que vieram depois.

De todo modo, revisitar Resident Evil 1 é como voltar no tempo e mergulhar de novo naquela sensação de tensão e mistério que marcou uma era. É mais do que apenas um jogo; é um pedaço da história do horror nos videogames, uma obra que, mesmo com gráficos datados, ainda consegue despertar o mesmo tipo de medo e admiração. Para mim, é um clássico que merece estar no hall da fama do gênero, não apenas por sua importância histórica, mas pelo impacto emocional que ainda carrega. Mesmo com todas as suas “rugas” e excentricidades, como as plantas medicinais que lembram um toque de alquimia bizarra, é exatamente esse charme peculiar que faz Resident Evil ser tão memorável até hoje.